Levantamento inédito idealizado pelo Movimento Pessoas à Frente aponta que 56% dos brasileiros acreditam que o corpo de funcionários do Estado não é representativo da diversidade brasileira e que desconhece os desafios da população;
6 em cada 10 brasileiros acreditam que os funcionários públicos não são respeitados e valorizados pela população, enquanto 74% entende que eles enfrentam desafios com ocupantes de cargos de liderança despreparados;
Pesquisa também mostra que 93% aprovam as avaliações e reconhecimento de desempenho e 79% veem a profissionalização do setor como importante para o combate à corrupção
Outubro de 2023 – Na semana em que se comemora o Dia do Servidor (28 de outubro), uma pesquisa inédita do DataFolha, elaborada a pedido do Movimento Pessoas à Frente, apresenta a opinião dos brasileiros sobre o funcionalismo público no Brasil e suas lideranças. Os dados apontam que, para 63% dos brasileiros, a minoria ou nenhum funcionário público é respeitado e valorizado pela população do país, enquanto 74% acreditam que todos, ou a maioria dos funcionários públicos, enfrentam dificuldades com chefes despreparados.
A percepção de 83% dos entrevistados é de que funcionários públicos poderiam oferecer mais para a população caso o governo desse mais condições para a realização de suas funções. Quatro em cada cinco brasileiros têm a percepção sobre o impacto positivo que lideranças bem-preparadas possuem sobre a vida da população.
Além dos desafios na relação com as lideranças, apenas 18% dos brasileiros acreditam que todos os funcionários públicos têm acesso a uma boa estrutura, adequada a prestação de bons serviços à população.
“Os dados da pesquisa confirmam a necessidade de que o país avance no debate sobre pessoas que trabalham no setor público e cujas ações impactam a vida de todos nós. O Brasil precisa urgentemente de uma transformação do Estado que aposte na implementação de políticas para lideranças que atuam em governos, em dar mais transparência sobre o funcionalismo, em reduzir as desigualdades salariais no setor público, em criar mecanismos de avaliação e reconhecimento de desempenho e de novos processos de seleção de servidores e cargos de confiança, com critérios de equidade étnico-racial e de gênero”, analisa Clarissa Malinverni, da secretaria executiva do Movimento Pessoas à Frente.
Gestão de Pessoas no Setor Público
Grande parte da população brasileira considera os diversos desafios enfrentados pelos funcionários públicos para realizar suas funções, e 93% dos entrevistados concordam que funcionários públicos deveriam ter seu trabalho avaliado constantemente, sendo recompensados de acordo com seu desempenho. A ampla maioria dos brasileiros (82%) também defende medidas de transparência nas informações sobre cargos de confiança e comissionados.
Ao mesmo tempo, 79% afirmaram acreditar que a profissionalização do serviço público é importante para o combate à corrupção, entre medidas como a realização de concursos, a progressão funcional e oportunidades de desenvolvimento profissional. 92% acreditam que os trabalhadores da gestão pública precisam de apoio, principalmente de suas lideranças e chefes, para se desenvolverem como profissionais e realizarem melhor seu trabalho, número que chega aos 98% entre os próprios funcionários públicos.
Quanto à seleção de lideranças, os requisitos ligados à qualificação, com processos seletivos baseados em competências, são vistos como os elementos mais importantes para a escolha de lideranças para 38% dos pesquisados, índice que subiu onze pontos em relação ao levantamento realizado em 2019. O tema fica à frente de experiência (29%) e valores morais próximos do entrevistado (17%).
Teto salarial no funcionalismo
Se, por um lado, é nítida a percepção da população quanto à ausência de condições apropriadas para realização de todas as funções atribuídas aos funcionários públicos no Brasil, seja por carência de infraestrutura material ou pela ausência de lideranças qualificadas, por outro, a percepção sobre possíveis privilégios salariais parecem persistir no imaginário da população brasileira. Segundo a pesquisa, 7 em cada 10 brasileiros são contra ganhos acima do teto constitucional para o funcionalismo público, mas 77% dos entrevistados admitem não conhecer este valor máximo que um funcionário público pode receber. Em outra questão da pesquisa, 1 em cada 4 entrevistados acreditam que todos ou a maioria dos funcionários ganham acima do teto.
Diversidade e corrupção no serviço público
A identificação da população com a parcela da sociedade que conduz os programas e políticas públicas também chama atenção na pesquisa de opinião, visto que a maior parte da população brasileira (56%) não acredita que os servidores públicos são representativos da sociedade, e nem que conhecem seus desafios. De forma coerente, 71% dos entrevistados acreditam que a representatividade contribuiria para aumentar a legitimidade do funcionalismo público e seu grau de confiança em relação aos mesmos.
Os números indicam que a diversidade racial e de gênero também é vista positivamente pela sociedade brasileira, com 86% dos entrevistados concordando que ações para promover e garantir igualdade de gênero no serviço público são importantes, número que chega a 89% quando a pergunta se refere à diversidade racial.
De forma prática, 90% dos entrevistados afirmaram acreditar que mais mulheres tornariam o serviço público melhor e 82% concordam que mais diversidade racial melhoraria o serviço no país, opinião confirmada por outros levantamentos.
A diversidade no setor público é uma bandeira do Movimento Pessoas à Frente, que se apoia em dados e experiências de sucesso para reforçar a importância da representatividade na formulação de políticas públicas mais efetivas, e que atendam às necessidades da população.
A pesquisa Opinião dos brasileiros sobre o funcionalismo público no Brasil e suas lideranças teve abrangência nacional, incluindo Capitais, cidades de outras Regiões Metropolitanas e cidades do Interior, de diferentes portes, em todas as Regiões do Brasil. Foram entrevistadas 2.025 pessoas, com margem de erro de 2 p.p As entrevistas foram realizadas entre os dias 11 a 18/09/2023.
Observação: a pergunta a respeito do conhecimento da população sobre o teto do funcionalismo público foi elaborada tendo como base o valor vigente até março de 2023, de R$ 39.293, valor atualmente fixado em R$ 41.650, segundo a Lei 14.520/23.
Confira a pesquisa completa aqui.
Entre os dias 27 e 29 de setembro a cidade de Lisboa, em Portugal, sediará um importante encontro de gestores públicos, pesquisadores acadêmicos, representantes de sindicatos, organizações e governos de países de língua portuguesa para a Conferência APEL – Administração Pública no Espaço Lusófono: diálogos, desafios e oportunidades. O evento é uma iniciativa da Sociedade Brasileira de Administração Pública (SBAP) e do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa (ISCSP), em colaboração com o Movimento Pessoas à Frente e o Fórum de Carreiras Típicas de Estado (Fonacate).
Além de comemorar os 10 anos da SBAP, a Conferência pretende fortalecer o diálogo entre os países lusófonos no campo da administração pública e celebrar a criação de um Comitê Temático sobre Gestão e Políticas Públicas junto à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). Por meio da Comissão Temática de Gestão e Políticas Públicas, projetos em temáticas relacionadas com a administração pública devem ser desenvolvidos em conjunto com entidades governamentais e não governamentais dos países lusófonos, outras comissões temáticas de observadores consultivos da CPLP, assim como outros organismos multilaterais.
“Temos o idioma que nos une, muitos desafios em comum e, certamente, experiências exitosas que podem ser compartilhadas e servir de inspiração e referência para que cada país busque aprimorar o funcionamento do Estado e entregar melhores serviços públicos para a população. Um espaço de discussão permanente vem para incentivar a colaboração entre os países lusófonos e promover a troca de experiências sobre o tema ”, diz Clarissa Malinverni, integrante da secretaria executiva do Movimento Pessoas à Frente, organização brasileira cujo foco é construir e viabilizar propostas voltadas à gestão de pessoas em governos, com foco em lideranças.
Entre os temas que serão discutidos no evento, uma mesa mediada por Pedro Passos Coelho, ex-Primeiro-Ministro de Portugal e professor da Universidade de Lisboa, debaterá reforma e gestão no setor público, com participação de Francisco Gaetani, Secretário Extraordinário para Transformação do Estado do Ministério de Estado da Gestão e Inovação em Serviços Públicos do Brasil; Fernando Gomes, Ministro da Administração Territorial e Poder Local da Guiné-Bissau; Gildo Armando Cossa, Secretário-Geral da Ordem dos Contabilistas e Auditores de Moçambique; Eduardo Grin, Professor da EAESP/FGV e Diretor de Relações Institucionais da SBAP, e Hermano Carmo, Professor Jubilado do ISCSP da Universidade de Lisboa.
Outro destaque será a aula magna do Secretário de Estado da Digitalização e da Modernização Administrativa, Mário Campolargo, responsável pela política digital do governo português. A programação completa está no link https://sbap.org.br/apel/.
O evento conta ainda com apoio institucional da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e com a parceria da Unidade de Coordenação de Administração Pública – UCAP/ISCSP/ULisboa, da Câmara Municipal de Lisboa, do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), da Universidade Federal de Viçosa (UFV), do Centro de Ciências da Administração e Socioeconômicas da Universidade do Estado de Santa Catarina e da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Iniciativa pede o comprometimento com propostas que possam avançar em atração, pré-seleção, desempenho, desenvolvimento e engajamento com foco em lideranças
Por uma gestão de lideranças mais efetiva no setor público, o Movimento Pessoas à Frente lançou uma carta pedindo o compromisso dos candidatos aos governos estaduais com propostas relacionadas à atração, pré-seleção, desempenho, desenvolvimento e engajamento de lideranças para superar os desafios do setor público.
O Movimento acredita que lideranças são fundamentais para a transformação profunda de que a gestão pública brasileira precisa e defende que com profissionais mais aptos e diversos ocupando posições estratégicas de liderança será possível garantir o foco nas entregas prioritárias para a sociedade.
Países como Chile e Reino Unido são conhecidos por seus cases de implementação de um sistema de alta direção com processos de pré-seleção bem estruturados que equilibram competência e confiança. No Brasil, os cargos de livre nomeação são quase que exclusivamente preenchidos por indicações políticas ou de servidores concursados, sem a necessidade de um processo de avaliação de perfil para a vaga.
“Esse período de pré-eleição em que os candidatos estão fechando suas propostas e planos de governo é a janela de oportunidade que temos para mostrar a importância da implementação de um sistema de alta direção para conquistarmos avanços na gestão de pessoas no setor público e, consequentemente, no nosso país”, afirma Diogo Lima, membro da Secretaria Executiva do Movimento.
A carta compromisso apresentada aos candidatos reúne cinco propostas defendidas pelo Movimento:
Os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) foram acordados, em reunião dos chefes de Estado e altos representantes da ONU, em setembro de 2015. Eles marcam uma agenda de longo prazo, que busca indicar caminhos e especificar prioridades, capacidades e resultados a serem alcançados em escala global. Os ODS são muito importantes para a perspectiva de cada país, porque permitem a coerência de políticas públicas em torno de uma agenda comum e representam uma oportunidade de alinhar capacidades de execução e coordenação em políticas públicas. Entretanto, o comprometimento de cada país membro com os ODS, incluindo Brasil, é ainda um processo em construção e o conhecimento e a disseminação dos resultados do trabalho do Comitê de Experts em Administração Pública das Nações Unidas (CEPA/ONU) pode ajudar nesta direção.
O CEPA é um colegiado de assessoramento do Conselho Econômico e Social (ECOSOC) da ONU, e atua na promoção e no desenvolvimento da administração pública e governança dos Estados Membros, particularmente tendo em vista a Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável e sua implementação. Os 24 membros do CEPA, entre os quais me encontro, elaboram uma série de estudos e diretrizes sobre temas de administração pública que refletem sobre a implementação de objetivos de desenvolvimento acordados internacionalmente, incluindo os ODS, e também encaminha recomendações ao ECOSOC sobre aspectos de gestão pública e governança de forma mais ampla, tais como o foco no capital humano, a governança participativa, a construção de capacidades em países em conflito e situação de crise, inovação em administração pública, governo digital entre tantos outros temas relevantes para a agenda de gestão pública e governança.
Entre as principais contribuições do CEPA destaco os princípios de governança efetiva para o desenvolvimento sustentável, que buscam balizar a construção de instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis, no contexto da Agenda 2030. Os princípios alinham aspectos como competência e profissionalização, tomada de decisão baseada em evidências, transparência e papéis de instituições independentes de controle, ao lado de outros, nem tanto institucionalizados nas boas práticas do setor público brasileiro, que refletem os desafios de uma gestão pública inclusiva, orientada pelos princípios de “não deixar ninguém para trás”; não-discriminação; participação; subsidiariedade e equidade intergeracional.
O foco nas pessoas no setor público permeia o trabalho do CEPA e é objeto de um dos grupos de trabalho do Comitê, o qual liderei este ano. Desde a Agenda 21, se reconhece que as pessoas e, mais especificamente, as pessoas no setor público, são parte essencial de qualquer estratégia de desenvolvimento sustentável. Dados do Banco Mundial indicam que os recursos humanos no setor público representam cerca de 32% do emprego remunerado no mundo e, pela sua representatividade, esta força de trabalho precisa se tornar um benchmark do desenvolvimento humano, inspirando melhores práticas de desenvolvimento de pessoas na sociedade.
Na sua última reunião, em abril de 2022, o CEPA observou os riscos decorrentes da polarização partidária, populismo autoritário e da “infodemia” na crescente desconexão das pessoas e seus governos. Destacou que a pandemia testou severamente as lideranças políticas, os arranjos institucionais locais, nacionais e globais e a confiança social nos governos e na força de trabalho, mais especificamente, no setor público. Por estas razões, working paper do CEPA focou nas dimensões de capacidade e de legitimidade da força de trabalho no setor público. A capacidade embarca uma série de estratégias para desenvolver recursos humanos resilientes e mecanismos de governança mais robustos, chaves para superar crises cada vez mais recorrentes, sem perder de vista os objetivos do milênio. O trabalho aponta que programas de ajustes estruturais e estratégias inspiradas na Nova Gestão Pública orientadas por recortes fiscais tiveram efeitos deletérios em vários países do mundo, principalmente para as capacidades estatais na área de saúde pública. Entretanto, um processo rico de aprendizagem emergiu na gestão da pandemia, inclusive em países em desenvolvimento, indicando novas capacidades e competências de recursos humanos mais responsivos, robustos e resilientes, indispensáveis para o alcance dos ODS. Paralelamente, crises, como a da pandemia, aguçam a necessidade de enfrentar vulnerabilidades sociais e superar a desigualdade nas suas múltiplas dimensões (gênero, raça, idade, entre outros), inclusive dentro do setor público. Crises ativam a dimensão da legitimidade, porque demandam o resgate da relação de confiança entre o governo e o setor público. Resgatar estas relações de confiança é uma tarefa complexa que depende da qualidade das experiências dos cidadãos com as instituições públicas. O servidor público é o ponto focal destas experiências. O relatório reconhece a importância de resgatar estratégias orientadas pela busca de equidade: reconhecimento e enfrentamento de práticas discriminatórias; diminuição das barreiras administrativas que impõem maiores custos para as populações mais vulneráveis e diminuição das desigualdades dentro do próprio setor público são algumas das estratégias discutidas no decorrer da reunião do CEPA.
Esta agenda é relevante para o país e demanda a consolidação de uma rede de colaboração entre instituições públicas, privadas ou sem fins lucrativos, atores que compactuam com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e que pensam em estratégias que alinhem as políticas públicas e as práticas do setor público em torno desta agenda comum. No Brasil, por exemplo, o Movimento Pessoas à Frente, movimento da sociedade civil dedicado ao debate e à construção da melhoria do Estado, tem contribuído para esta agenda desde 2020, ao articular diversos atores como sindicatos, fundações, especialistas, na construção de propostas para a gestão de pessoas no serviço público.
*Alketa Peci é professora da EBAPE/FGV, membro da CEPA/ONU e integrante do Movimento Pessoas à Frente
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