Reforma Administrativa avança no combate aos supersalários, mas necessita de ajustes nas regras de contratação de temporários, avalia Movimento Pessoas à Frente

06/11/2025 às 00:05

  • Na temática de contratações por tempo determinado, o Movimento considera como ponto positivo a criação do Portal Unificado Nacional, mas aponta a necessidade de aprimoramento em outros itens, como a criação de uma regra que impeça a contratação de temporários para atividades-fim em funções exclusivas de Estado, como policiais e guardas municipais

Outubro de 2025 – O Movimento Pessoas à Frente lançou nesta terça-feira (04/10) duas análises técnicas sobre temas-chave na proposta de Reforma Administrativa que segue em tramitação no Congresso Nacional: supersalários e privilégios e contratações por tempo determinado. Pela amplitude da Reforma, que prevê cerca de 70 medidas em quatro eixos, o Movimento elencou os focos de análise de acordo com as prioridades da organização ao longo dos últimos cinco anos: supersalários, contratações temporárias, mulheres no serviço público e lideranças públicas. Os temas são considerados prioritários pela organização e contam com propostas legislativas elaboradas pelo Movimento Pessoas à Frente para contribuir com um Estado mais efetivo.

Supersalários e privilégios

A análise do Movimento Pessoas à Frente sobre o texto da Reforma Administrativa que se refere aos supersalários e privilégios foi realizada com apoio dos pesquisadores João Paulo Bachur (Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa – IDP), Maria Fernanda Ferreira Teixeira (Universidade de Brasília – UnB) e Rafael Viegas (Fundação Getulio Vargas – FGV). O documento destaca que a proposta de Reforma Administrativa traz avanços importantes para acabar com os supersalários, mas precisa de ajustes para que tenha ainda mais efetividade.

O tema supersalários é objeto de destaque na proposta – dos 70 itens apresentados, 19 compõem o Eixo 4 – Extinção de Privilégios, representando 27% do total. Todos estão concentrados na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) apresentada. A partir de um amplo diagnóstico, e conforme os dados e evidências já consolidados em estudos organizados pela sociedade civil e extensamente reproduzidos na imprensa, o Movimento Pessoas à Frente avalia que a maioria das propostas vai na direção certa, e devem ser aprovadas pelo Congresso Nacional como sinal de um compromisso com o fim de privilégios e supersalários no serviço público, em linha com a construção de uma política remuneratória mais justa, menos desigual e com o resgate da autoridade do teto constitucional.

O Movimento considera que são pontos positivos, especialmente, as propostas apresentadas na Área XIV – Igualdade entre Servidores Públicos, tendo em vista que trazem ganhos ao estabelecer uma lista de vedações a práticas que concedem vantagens remuneratórias e viabilizam parte considerável de adicionais inadequados que extrapolam o limite remuneratório. Presentes na PEC da Reforma e condizentes ao anteprojeto de PEC proposto pelo Movimento Pessoas à Frente estão, ambos como proposta de inserção do inciso XXIII ao art. 37, vedados os seguintes privilégios:

  1. Férias superiores a 30 dias por ano e adicional superior a ⅓ da remuneração do período de férias;
  2. Adicionais ou indenizações por substituição, como por exemplo licenças-compensatórias, acúmulo de acervo, dentre outras denominações;
  3. Progressões na carreira baseadas exclusivamente em tempo de serviço, demandando efetiva gestão de desempenho;
  4. Licenças-prêmio, assiduidade ou decorrentes apenas de tempo de serviço, ressalvadas, nos termos da lei, licenças para fins de capacitação;
  5. Pagamentos retroativos de caráter geral, mesmo com reconhecimento de verbas devidas, demandando decisões individuais para evitar o reconhecimento regularmente feito no âmbito de conselhos representativos de carreiras do sistema de justiça;
  6. Instituição de parcelas remuneratórias ou indenizatórias que não sejam por lei aprovada no Poder Legislativo. 

Há, ainda, outros pontos considerados positivos pelo Movimento Pessoas à Frente, como a racionalização das verbas indenizatórias (proposta 59). Neste caso, o principal destaque é a construção de um conceito adequado para a definição do que são as verbas indenizatórias. A proposta presente na PEC da Reforma Administrativa tomou como base o estudo jurídico e o anteprojeto de lei do Movimento Pessoas à Frente. A proposta 59 avança, também, na transparência remuneratória, prevendo divulgação individualizada e padronizada em formato aberto, mas carece de regulamentação detalhada para garantir uniformidade entre poderes e entes federativos, o que pode ser feito em Projeto de Lei Ordinário que estabeleça prazo de transição, integração de dados, e responsabilização caso os parâmetros não sejam atendidos. Em diálogo com a equipe técnica do Grupo de Trabalho da Reforma Administrativa, houve sinalização positiva, e a reflexão será levada aos parlamentares responsáveis, para que seja feita a regulamentação mais detalhada da transparência remuneratória e a previsão de mecanismos de responsabilização, tanto aos parâmetros de transparência quanto ao descumprimento das vedações constitucionais. 

Destaque, ainda, para a área XVI – Gestão de Recursos Públicos e Advocacia Pública, considerada positiva, pois limita o pagamento de honorários à jurisprudência já estabelecida pelo STF na ADI n° 6053, isto é, limita o recebimento de honorários ao teto constitucional. Este ponto carece apenas de ajuste redacional, também sinalizado positivamente pela equipe técnica do GT da Reforma para sugestão aos parlamentares responsáveis. Além disso, é positiva a vedação à criação de fundos para fins de pagamento de remuneração e benefícios, impossibilitando a gestão privada de recursos públicos.

Para a área XVII – Aperfeiçoamento da Atuação do Poder Judiciário e dos Serviços Notariais e de Registro, há  duas medidas em linha com o anteprojeto de PEC do Movimento Pessoas à Frente: o fim da aposentadoria compulsória como sanção a magistrados (proposta 68) e a possibilidade de demissão de membros do Judiciário e do Ministério Público (proposta 69). 

Contudo, nesta temática, o Movimento considera um ponto de atenção importante. Para conferir maior efetividade às propostas 68 e 69, a proposta 67 – Governança no CNJ e no CNMP – requer ajustes que acabem com as assimetrias entre o regime disciplinar das carreiras do sistema de Justiça e o das demais carreiras públicas. Para isso, a organização sugere: reformular a composição dos Conselhos, garantindo maior presença de representantes da sociedade civil, da academia e de servidores de carreira e estabelecer transparência ativa sobre decisões disciplinares, indicadores de desempenho e uso de recursos públicos. Com exceção da reformulação dos Conselhos, as demais medidas serão levadas à reflexão dos parlamentares responsáveis pela equipe técnica do GT.

Para Jessika Moreira, diretora-executiva do Movimento Pessoas à Frente, “a reforma administrativa é uma oportunidade para que o Brasil possa finalmente acabar com os supersalários, que trazem um ônus bilionário ao país. A proposta da reforma em relação aos supersalários, apesar de precisar de ajustes pontuais, está no caminho certo. Esperamos que esses pontos sejam aprovados o mais brevemente possível pelo Congresso Nacional”.

Contratações por tempo determinado 

A análise do Movimento Pessoas à Frente sobre o texto da Reforma Administrativa que se refere às contratações por tempo determinado foi realizada com apoio de Vera Monteiro, presidente do Conselho do Movimento Pessoas à Frente e professora da Fundação Getulio Vargas – FGV. 

A proposta referente à Reforma Administrativa, de acordo com a avaliação do Movimento, traz pontos positivos, em linha com o anteprojeto de Lei Geral de Contratação por Tempo Determinado no Serviço Público. Entre eles, destacam-se:

  1. Hipóteses de contratação (art. 40 do PL da Reforma): definem quando é adequada a contratação temporária para suprir carências emergenciais de pessoal, ou então quando não se justifica o preenchimento por meio ordinário, como no caso de transitoriedade, rotatividade, ou mudança demográfica, por exemplo;
  2. Concursos públicos vigentes (art. 43 do PL da Reforma): regras que estabelecem que se houver candidatos aprovados em concurso público vigente, não será admitida a contratação temporária para o mesmo serviço ou função, exceto quando for necessário cobrir afastamentos temporários de servidores efetivos;
  3. Portal Unificado Nacional (art. 44 do PL da Reforma): criação do Banco Nacional de Contratações Temporárias/Portal Nacional de Contratação por Tempo Determinado (art. 3º do anteprojeto) com o objetivo de centralizar a divulgação obrigatória das contratações por tempo determinado e dar transparência à sociedade sobre os processos seletivos realizados, permitindo o acompanhamento, a avaliação e os procedimentos de seleção e de contratação de agente;
  4. Direitos mínimos nacionalmente aplicados aos trabalhadores temporários (art. 47 e 48 do PL da Reforma): a lista de direitos e licenças garantidos corrige a disparidade inaceitável entre entes federativos e a frequente ausência de muitos deles;
  5. Gestão de desempenho (art. 46, § 1°): a proposta prevê a gestão e avaliação do desempenho dos trabalhadores temporários, para eventual prorrogação do contrato ou mesmo para sua extinção antes do fim de sua vigência;
  6. Quarentena de 24 meses (art. 50, III): restrita ao mesmo serviço ou à mesma função, vinculada ao mesmo órgão.

Por outro lado, há pontos que, na visão do Movimento Pessoas à Frente e dos especialistas consultados, precisam ser aprimorados para que a regulamentação seja, de fato, efetiva e não crie consequências negativas ao uso do instrumento. Dentre esses pontos, destacam-se:

  1. Ausência de regra que impeça a contratação de temporários para atividades-fim específicas de acordo com a jurisprudência do STF(carreiras jurídicas, de fiscalização tributária, policial militar, de polícia judiciária e de guarda municipal): o disposto no art. 2°, § 1º do anteprojeto de lei do Movimento Pessoas à Frente é fundamental para a aplicação harmoniosa à Constituição Federal, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal sobre o uso adequado do instrumento;
  2. Obrigatoriedade de realização de processos seletivos (art. 41, caput e § 1º do PL da Reforma) e hipótese de contratação direta: o texto desconsidera a realidade dos entes municipais, cuja grande maioria não faz, impondo sua realização sem regra transitória, além de não considerar casos imprescindíveis de contratação direta, como o por notória especialização. Conectado à necessidade de hipótese de contratação direta estão regras mais robustas para evitar nepotismo. A equipe técnica do GT sinalizou positivamente a essas sugestões, e irá levar as reflexões, incluindo especificamente a contratação direta no caso de Professores Visitantes, aos parlamentares responsáveis.
  1. Ausência de atenção dedicada à educação: área com maior concentração de contratações temporárias e desafios complexos para garantir a continuidade e qualidade dos serviços públicos. O principal ponto com oportunidade de melhoria é a inserção da menção expressa ao Piso Nacional do Magistério na proposta. A equipe técnica do GT sinalizou positivamente sobre este importante tópico e irá levar a reflexão aos parlamentares responsáveis.

Para Jessika Moreira, “diferentemente dos supersalários, em que a proposta da reforma administrativa está mais avançada, no caso da contratação de profissionais temporários há pontos que precisam ser reavaliados, como a necessidade de criação de uma regra que impeça a contratação de temporários para atividades-fim específicas de acordo com a jurisprudência do STF”.